terça-feira, 11 de maio de 2010

Viagem ao passado...

Há muitos anos que não entrava naquele local. Um café dos meus tempos de adolescente revolucionário. Pedi um café. O dono do café sorriu e olhou-me como se a minha cara não lhe fosse estranha, mas a incerteza talvez não lhe tenha permitido fazer-me qualquer pergunta. Sentei-me numa das mesas da sala, e senti-me estranho, mentiria se disse-se que me sentia como há anos atrás entre um pastel de nata, um café e um maço de tabaco comprado no primeiro intervalo da manhã. Não, não me senti assim, senti que o tempo passou, as mesas sendo as mesmas, o dono mantendo o seu sorriso simpático, senti que o tempo passou e senti que ali, apenas estavam fragmentos de um Eu tão distante de quem hoje sou.
Bebi o meu café fumei o meu cigarro, paguei com uma moeda de 50 cêntimos e um muito bom dia, obrigado e sai. Antes nunca sairia dali sem uma pastilha para mastigar na aula de Matemática, ou uns rebuçados de mentol para disfarçar o hálito do cigarro, tudo com apenas uma moeda de 20 escudos ou menos. Passei pela minha antiga escola, já há alguns anos que não o fazia. O mesmo aspecto, o mesmo cheiro estranho (haxixe) que logo consegui entender o que era, que se espalhava pelos corredores entrando pelas salas dentro e que infestava tudo quanto era sítio.
Passeei-me calmamente pelo pátio da escola. Os recantos de antes desapareceram, já não existem os bancos de madeira de tantas manhãs e tardes, estes são outros, já não guardam as conversas intermináveis entre amigos, os desabafos, os namoros entre aulas, muitos dos meus desesperos, muitas gargalhadas e sorrisos dos mais variados feitios e cores. Cruzei-me com um pouco de mim por aqui e por ali, mas não me reconheci, não creio que fizesse algum sentido falarmos, quanto mais que esse meu Eu me tivesse reconhecido e se tivesse dirigido a mim com um aperto de mão e me pedisse um cigarro ou lume depois de uma aula de Física. Não faria sentido. Não sei o que lhe diria se ele agora me perguntasse sobre os sonhos de antes, os medos, o que faço agora, se amo alguém, se sou feliz, se consegui o queria. Talvez lhe mentisse sobre algumas coisas, talvez lhe disse-se a verdade sobre outras, talvez apenas me limitasse a sorrir e lhe disse-se para esperar um pouco mais, cada coisa no seu tempo, sinceramente não sei.
Sai pelo portão de sempre, não voltei a pé para casa como antes o faria e entrei no carro e, sozinho lá fui lançando um olhar triste para o retrovisor.